Notícia

Discurso de 2021 sobre o estado da União proferido pela presidente Ursula von der Leyen

"Faz fé o texto proferido"

A versão original do discurso está disponível aqui.

FORTALECER A ALMA DA NOSSA UNIÃO

Introdução

Senhor Presidente,
Senhoras e Senhores Deputados,

Muitas pessoas sentem que as suas vidas ficaram suspensas enquanto o mundo continuou a avançar rapidamente.

A rapidez dos acontecimentos e a magnitude dos desafios são por vezes difíceis de apreender.

Este tem sido, igualmente, um momento de balanço e introspeção. Das pessoas que reavaliam as suas vidas até aos debates mais amplos sobre a partilha de vacinas e valores partilhados.

Porém, quando recordo o ano que passou e olho para o presente estado da União, vejo uma alma forte em tudo o que fazemos.

Robert Schuman afirmou, em tempos: A Europa necessita de uma alma, de um ideal, e da vontade política para servir esse ideal.

A Europa deu vida a estas palavras nos últimos doze meses.

Escolhemos defrontar em conjunto a maior crise global de saúde do último século, para que todas as partes da Europa tenham o mesmo acesso a uma vacina que salva vidas.

Escolhemos responder em conjunto à mais profunda crise económica mundial de há décadas, com o Instrumento de Recuperação da União Europeia.

Escolhemos, enfim, enfrentar em conjunto a crise planetária mais grave de sempre, com o Pacto Ecológico Europeu.

Fizémo-lo em conjunto, como Comissão, como Parlamento, como 27 Estados-Membros. Como uma só Europa. E podemos orgulhar-nos disso.

Mas os tempos do coronavírus ainda não chegaram ao fim.

Enquanto a pandemia perdura, a nossa sociedade continua a sofrer — profundamente. Há corações que nunca poderemos remendar, histórias de vida que nunca poderemos concluir e tempo que nunca poderemos devolver aos nossos jovens. Enfrentamos desafios novos e duradouros num mundo que recupera — e se fratura — de forma desigual.

Não haja dúvidas: o próximo ano voltará a pôr-nos à prova.

No entanto, creio que o nosso espírito — a nossa alma — só revela verdadeiramente o seu esplendor quando é posto à prova.

Quando olho para a nossa União, sei que a Europa irá passar este teste.

O que me dá essa confiança é a inspiração que podemos retirar dos jovens europeus.

Porque os nossos jovens deram significado a palavras como empatia e solidariedade.
Eles acreditam que temos uma responsabilidade para com o planeta.
E, embora estejam preocupados com o futuro, estão determinados a melhorá-lo.

A nossa União será mais forte se for mais semelhante à próxima geração: ponderada, determinada e solidária. Assente em valores e ousada na ação.

Este espírito será mais importante do que nunca nos próximos doze meses. Esta é a mensagem da Carta de Intenções que enviei esta manhã ao Presidente David Sassoli e ao Primeiro-Ministro Janez Janša para definir as nossas prioridades para o próximo ano.

UMA EUROPA UNIDA NA ADVERSIDADE E NA RECUPERAÇÃO

Senhoras e Senhores Deputados,

Um ano é um período muito longo num contexto de pandemia.

Quando aqui estive, há 12 meses, não sabia quando — ou mesmo se — teríamos uma vacina segura e eficaz contra a COVID-19.

Porém, hoje, e contra todas as críticas, a Europa está na vanguarda a nível mundial.

Mais de 70 % dos adultos na UE estão totalmente vacinados. Fomos os únicos a partilhar metade da produção de vacinas com o resto do mundo. Disponibilizámos mais de 700 milhões de doses aos cidadãos europeus, bem como mais de 700 milhões de doses a mais de 130 países do resto do mundo.

Fomos a única região do mundo a fazê-lo.

Uma pandemia é uma maratona, não uma corrida de velocidade.

Seguimos a ciência.
Cumprimos face à Europa. Cumprimos face ao mundo.
Escolhemos a via certa, pois escolhemos a via europeia. E funcionou!

Todavia, embora tenhamos todas as razões para estarmos confiantes, não temos motivos para ficar complacentes.

A nossa primeira — e mais urgente — prioridade é acelerar a vacinação a nível mundial.

Com menos de 1 % das doses globais administradas em países de baixos rendimentos, a escala da injustiça e o nível de urgência são óbvios. Esta é uma das grandes questões geopolíticas do nosso tempo.

A Equipa Europa está a investir mil milhões de EUR para aumentar a capacidade de produção de mARN em África. Já nos comprometemos a partilhar 250 milhões de doses.

Posso hoje anunciar que a Comissão acrescentará uma nova doação de 200 milhões de doses adicionais em meados do próximo ano.

Trata-se de um investimento na solidariedade, mas também na saúde mundial.

A segunda prioridade é prosseguir os nossos esforços dentro da Europa.

Constatamos divergências preocupantes entre as taxas de vacinação na União.

Temos, por isso, de manter a dinâmica.

A Europa está preparada. Temos 1 800 milhões de doses adicionais garantidas. Tal é suficiente para nós e para a nossa vizinhança, quando for necessário administrar doses de reforço. Façamos tudo o que estiver ao nosso alcance para garantir que esta não se transforme numa pandemia dos não vacinados.

A última prioridade é reforçar a nossa preparação para as pandemias.

No ano passado, disse que era tempo de construir uma União Europeia da Saúde. Hoje, concretizamos esse desafio, apresentando uma proposta para criar e pôr em funcionamento a HERA.

Este será um trunfo enorme para enfrentar futuras ameaças para a saúde, numa fase mais precoce e em melhores condições.

Dispomos da capacidade científica e de inovação, dos conhecimentos especializados do setor privado e de autoridades nacionais competentes. Temos agora de reunir tudo isto, incluindo um financiamento maciço.

Assim, proponho uma nova missão de preparação e resiliência no domínio da saúde em toda a UE. Esta deve ser apoiada por um investimento da Equipa Europa de 50 mil milhões de EUR até 2027.

O nosso objetivo é garantir que nenhum vírus transformará uma epidemia local numa pandemia global. Não há melhor retorno do investimento do que este.

Senhoras e Senhores Deputados,

Os trabalhos sobre a União Europeia da Saúde constituem um grande passo em frente. Gostaria de agradecer a esta Câmara o seu apoio.

Demonstrámos que, quando atuamos em conjunto, conseguimos fazê-lo rapidamente.

Tomemos como exemplo o Certificado Digital da UE:

Até à data, foram emitidos mais de 400 milhões de certificados individuais em toda a Europa. No total, 42 países de 4 continentes apanharam o comboio.

A Comissão apresentou uma proposta em março.

O Parlamento Europeu deu-lhe o apoio necessário!
Três meses depois, estava operacional.

Graças a este esforço conjunto, enquanto o resto do mundo debatia essa possibilidade, a Europa concretizou-a.

Fizemos muitas coisas bem. Avançámos rapidamente para criar o SURE. Este programa apoiou mais de 31 milhões de trabalhadores e 2,5 milhões de empresas em toda a Europa.

Aprendemos com as lições do passado, quando estivemos demasiado divididos e demorámos a atuar.

A diferença é flagrante: da última vez, foram necessários oito anos para que o PIB da área do euro regressasse aos níveis anteriores à crise.

Desta feita, prevemos que 19 países regressem aos níveis anteriores à pandemia ainda este ano, ao passo que os restantes o conseguirão no seguinte. No último trimestre, o crescimento na área do euro ultrapassou tanto o dos EUA como o da China.

Mas isto é apenas o início. As lições da crise financeira devem servir de admonição: nessa altura, a Europa declarou vitória demasiado cedo e pagou o preço por isso. Não repetiremos esse erro.

A boa notícia é que, graças ao Instrumento de Recuperação da União Europeia, iremos agora investir tanto na recuperação a curto prazo como na prosperidade a longo prazo.

Abordaremos questões estruturais da nossa economia: das reformas do mercado de trabalho em Espanha, às reformas do regime de pensões na Eslovénia ou à reforma fiscal na Áustria.

Investiremos, num nível sem precedentes, na tecnologia 5G e na banda larga. Não menos importante será o investimento nas competências digitais. Para tal, precisamos da dedicação dos líderes europeus e de um diálogo estruturado ao mais alto nível.

A nossa resposta proporciona uma orientação clara tanto para os mercados como para os investidores.

Porém, quando olhamos para o futuro, temos igualmente de refletir sobre o modo como a crise alterou os contornos da economia — do aumento da dívida ao impacto desigual nos diversos setores, passando pelas novas formas de trabalho.

Para tal, a Comissão relançará o debate sobre a revisão da governação económica nas próximas semanas. O objetivo é chegar a um consenso sobre o caminho a seguir, bem a tempo de 2023.

Senhoras e Senhores Deputados,

Celebraremos em breve os 30 anos do mercado único da UE. Este tem sido, ao longo deste período, o grande impulsionador do progresso e da prosperidade na Europa.

No início da pandemia, defendêmo-lo contra as pressões da erosão e da fragmentação. No contexto da recuperação, o mercado único é o motor da criação de empregos de qualidade e da competitividade.

Este aspeto é particularmente importante no mercado único digital.

Apresentámos propostas ambiciosas ao longo do último ano.

Propostas para conter o poder de controlo de acesso exercido pelas grandes plataformas.

Para apoiar a responsabilidade democrática dessas plataformas.

Para promover a inovação.

Para canalizar o poder da inteligência artificial.

A questão digital é determinante e os Estados-Membros partilham desta visão. As despesas digitais no âmbito do Instrumento de Recuperação da União Europeia irão mesmo ultrapassar a meta de 20 %.

Tal reflete a importância de investir na soberania tecnológica europeia. Temos de redobrar esforços para moldar a transformação digital de acordo com as nossas próprias regras e valores.

Permitam-me dar destaque aos semicondutores, esses pequenos circuitos que fazem com que tudo funcione: dos telefones inteligentes e das trotinetas elétricas aos comboios ou a fábricas inteligentes inteiras.

Não existe mundo digital sem circuitos integrados. A verdade é que, enquanto falamos, algumas linhas de produção já estão a funcionar a um ritmo reduzido — apesar da procura crescente — devido à escassez de semicondutores.

Além disso, muito embora a procura mundial tenha explodido, a quota da Europa na globalidade da cadeia de valor, desde a conceção à capacidade de produção, diminuiu. Estamos dependentes dos circuitos mais avançados fabricados na Ásia.

Por conseguinte, não se trata apenas de uma questão de competitividade. Trata-se também de uma questão de soberania tecnológica. Coloquemos, por isso, toda a nossa atenção nesta questão.

Apresentaremos uma nova lei europeia no domínio dos circuitos integrados. Temos de interligar as nossas capacidades de investigação, conceção e ensaio de craveira mundial. Temos de coordenar investimentos nacionais e da UE ao longo da cadeia de valor.

O objetivo é criar em conjunto um ecossistema europeu de circuitos integrados de vanguarda, que inclua a produção. Tal será um garante da segurança do aprovisionamento e permitirá desenvolver novos mercados para tecnologias europeias revolucionárias.

Sem dúvida, trata-se de uma tarefa árdua. E estou ciente de que alguns alegam que é impossível.

Mas isso foi o mesmo que, há 20 anos, se disse sobre o Galileo.

E vejam o que aconteceu. Juntos, perseverámos. Hoje em dia, os satélites europeus fornecem o sistema de navegação a mais de 2 mil milhões de telemóveis inteligentes em todo o mundo. Somos líderes mundiais. Por isso, voltemos a ousar, desta vez com semicondutores.

Senhoras e Senhores Deputados,

A pandemia deixou marcas profundas e teve um impacto enorme na nossa economia social de mercado.

Noite após noite, marcámos presença, à janela ou à soleira da porta, para aplaudir os trabalhadores da primeira linha.

Todos nos apercebemos de quanto dependíamos destas pessoas. Profissionais empenhados com espírito de entrega, apesar de receberem um salário inferior, terem menos proteção e menos segurança.

Os aplausos nas ruas das nossas cidades podem ter cessado, mas a força das nossas emoções deve perdurar no tempo.

É por este motivo que é tão importante concretizar o Pilar Europeu dos Direitos Sociais.

Trata-se de criar empregos mais dignos, condições de trabalho mais justas, melhores cuidados de saúde e uma vida mais equilibrada.

Um dos principais ensinamentos que retirámos da pandemia foi o valor do tempo. Aprendemos que não existe tempo mais valioso do que aquele que consagramos aos nossos entes queridos.

Foi por esse motivo que decidimos propor uma nova estratégia europeia para a prestação de cuidados.

Para que todos os homens e todas as mulheres possam beneficiar dos melhores cuidados possíveis e alcancem um bom equilíbrio de vida. Mas a justiça social não é unicamente uma questão de tempo, é também uma questão de equidade fiscal.

Numa economia social de mercado como a nossa, é positivo que as empresas obtenham lucros. Mas, se os obtêm, é graças à qualidade das nossas infraestruturas, da nossa segurança social e dos nossos sistemas educativos.

Consequentemente, o mínimo que podem fazer é dar o seu justo contributo. É por esse motivo que vamos continuar a combater a evasão e a fraude fiscais.

Vamos apresentar uma proposta legislativa com o objetivo de tributar os lucros ocultos das empresas de fachada. E faremos todos os possíveis por celebrar um acordo histórico a nível mundial sobre a taxa mínima do imposto sobre o rendimento das pessoas coletivas.

O pagamento do montante justo em impostos não é apenas uma questão de finanças públicas, é sobretudo uma questão de equidade.

Senhoras e Senhores Deputados,

Todos beneficiámos com os fundamentos da economia social de mercado europeia. Temos de assegurar que a próxima geração pode construir o seu próprio futuro.

Dispomos de uma geração de jovens altamente qualificados, extremamente talentosos e fortemente motivados. Uma geração que sacrificou tanto em prol da segurança dos outros.

A juventude é, normalmente, a idade das descobertas. A idade em que se vivem novas experiências. Em que se fazem amigos que ficam para toda a vida. Em que cada um descobre o seu próprio caminho. Porém, o que acabámos de exigir aos nossos jovens? Que mantivessem o distanciamento social, que continuassem confinados e que seguissem os seus estudos em casa. Durante mais de um ano.

Tudo aquilo que temos feito, desde o Pacto Ecológico ao Instrumento de Recuperação da União Europeia, visa proteger o futuro dos nossos jovens.

É por isso que este instrumento deve ser financiado por novos recursos próprios, sobre os quais temos vindo a trabalhar.

De igual modo, temos de garantir que não damos origem a novas falhas. Porque a Europa precisa de todos os seus jovens.

Importa prestar apoio a todos aqueles que se encontram excluídos. Aqueles que não têm emprego. Aqueles que não estudam nem seguem qualquer formação.

Para os jovens nessa situação, tencionamos propor um novo programa, intitulado ALMA.

Esse programa dar-lhes-á a possibilidade de terem uma experiência profissional temporária noutro Estado-Membro.

Pois também estes jovens merecem ter uma experiência como o Erasmus, para poderem adquirir competências, estabelecer contactos e criar a sua própria identidade europeia.

Contudo, se queremos efetivamente moldar a nossa União à sua imagem, os jovens devem poder moldar, eles próprios, o futuro da Europa. A nossa União precisa de uma alma e de uma visão de futuro com que os jovens se identifiquem.

Como também se interrogou Jacques Delors: Como poderemos construir a Europa se os jovens não a virem como um projeto coletivo e uma representação do seu próprio futuro?

É por esta razão que tencionamos propor que 2022 seja o Ano Europeu da Juventude. Um ano consagrado à valorização dos jovens que, por seu turno, já abdicaram de tanto pelo bem dos outros. E serão também os jovens a liderar os debates da Conferência sobre o Futuro da Europa.

Trata-se do seu futuro e, por isso mesmo, deve tratar-se da sua conferência.

Como foi referido no início do nosso mandato, a Comissão estará pronta a dar seguimento a tudo o que for decidido pela Conferência.

UMA EUROPA UNIDA NA RESPONSABILIDADE

Senhoras e Senhores Deputados,

Esta é uma geração com consciência, que nos está a pressionar a ir mais longe e mais depressa para fazer face à crise climática.

Os acontecimentos deste verão só lhe vieram dar razão. Assistimos a inundações na Bélgica e na Alemanha. E a incêndios florestais consumindo ilhas gregas e colinas em França.

Se não acreditarmos nos nossos próprios olhos, basta-nos apenas seguir a ciência.

A ONU publicou recentemente o relatório do PIAC, o Painel Intergovernamental sobre as Alterações Climáticas. Trata-se da autoridade em matéria de ciência das alterações climáticas.

O relatório não deixa qualquer dúvida. As alterações climáticas têm origem humana. Mas, dada essa origem humana, podemos fazer algo em relação a ela.

Tal como ouvi recentemente: Está a aquecer. Fomos nós. Temos a certeza. A situação é má. Mas tem solução.

E essa mudança já está a acontecer.

No primeiro semestre deste ano, foram registados na Alemanha mais veículos elétricos do que veículos a gasóleo. A Polónia é atualmente o maior exportador da UE de baterias de automóveis e autocarros elétricos. Ou tomemos o exemplo do novo Bauhaus europeu, que levou a uma explosão da criatividade de arquitetos, designers e engenheiros em toda a União.

É evidente que algo se está a passar.

E esse é o cerne do Pacto Ecológico Europeu.

No meu discurso do ano passado, anunciei a meta de, pelo menos, 55 % de redução das emissões até 2030.
Desde então, transformámos os nossos objetivos climáticos em obrigações jurídicas.
Fomos a primeira grande economia a apresentar legislação abrangente para conseguir concretizar esses objetivos.

Já perceberam a complexidade dos pormenores. Mas o objetivo é simples. Fixaremos um preço para a poluição. Limparemos a energia que utilizamos. Teremos automóveis mais inteligentes e aviões mais limpos.

E asseguraremos que o reforço da ambição climática seja acompanhado de uma maior ambição social. Esta transição ecológica tem de ser justa. É por esta razão que propusemos um novo Fundo Social para a Ação Climática, que visa combater a pobreza energética que já afeta 34 milhões de europeus.

Conto com o Parlamento e com os Estados-Membros para honrarem este pacote e esta ambição, em conjunto.

A Europa pode fazer muito no que diz respeito às alterações climáticas e à crise do mundo natural. E apoiará outros países neste processo. Tenho o prazer de anunciar, hoje, que a UE duplicará o financiamento externo para a biodiversidade, em especial para os países mais vulneráveis.

Mas a Europa não pode fazê-lo sozinha.

A COP26, que terá lugar em Glasgow, será um momento decisivo para a comunidade global.

As principais economias — dos EUA ao Japão — estabeleceram a ambição de alcançar a neutralidade climática em 2050 ou pouco tempo depois. Estes objetivos têm, agora, de ser apoiados por planos concretos, elaborados a tempo da conferência de Glasgow. Isto porque os atuais compromissos para 2030 não permitirão concretizar o objetivo de manter o aquecimento global abaixo dos 1,5 °C.

Todos os países têm uma quota-parte de responsabilidade!

Os objetivos que o Presidente Xi Jinping fixou para a China são encorajadores. Mas apelamos para essa mesma liderança no que toca a definir o modo como a China lá chegará. O mundo ficaria aliviado se os líderes chineses demonstrassem capacidade para atingir o pico de emissões até meados da década e se afastarem do carvão, tanto a nível interno como no estrangeiro.

Embora todos os países partilhem esta responsabilidade, as principais economias têm obrigações especiais perante os países menos desenvolvidos e mais vulneráveis. O financiamento da ação climática é essencial para estes países — tanto para efeitos de atenuação como de adaptação.

No México e em Paris, o mundo comprometeu-se a disponibilizar 100 mil milhões de dólares por ano até 2025.

Cumprimos o nosso compromisso. A Equipa Europa contribui com 25 mil milhões de dólares por ano. Mas outras partes continuam a apresentar lacunas profundas no sentido de atingir o objetivo global.

Colmatar estas lacunas aumentará as possibilidades de sucesso em Glasgow.

Hoje, a minha mensagem é a de que a Europa está pronta para fazer mais. Proporemos um montante adicional de 4 mil milhões de EUR para o financiamento da ação climática até 2027. Mas esperamos que os Estados Unidos e os nossos parceiros também intensifiquem os seus esforços.

Se os EUA e a UE colmatassem, em conjunto, o défice de financiamento da ação climática, transmitiriam um forte sinal de liderança global em matéria de clima. É hora de agir.

Senhoras e Senhores Deputados,

Esta liderança climática e económica é fundamental para os objetivos globais e de segurança da Europa.

Reflete igualmente uma mudança mais generalizada nos assuntos mundiais num momento de transição para uma nova ordem internacional.

Estamos a entrar numa nova era de hipercompetitividade.

Uma era em que alguns recorrem a todos os estratagemas para ganhar influência: sejam eles promessas de vacinas e empréstimos com taxas de juro elevadas ou mísseis e desinformação.

Uma era de rivalidades regionais e de grandes potências que se vigiam entre si.

Os acontecimentos recentes no Afeganistão não são a causa desta mudança, são antes um sintoma.

Antes de mais, quero ser clara: estamos ao lado do povo afegão. Das mulheres e das crianças, dos procuradores, dos jornalistas e dos defensores dos direitos humanos.

Penso, em especial, nas mulheres juízes que se escondem agora dos homens que condenaram à prisão. Estas mulheres estão em risco devido ao seu contributo para a justiça e o Estado de direito. Temos de as apoiar e coordenaremos todos os esforços com os Estados-Membros para as colocar em segurança.

De igual modo, temos de continuar a apoiar todos os afegãos no país e nos países vizinhos. É nossa obrigação fazer tudo o que estiver ao nosso alcance para evitar o risco real de uma grande fome e de uma catástrofe humanitária. Faremos a nossa parte, aumentando a ajuda humanitária concedida ao Afeganistão, com 100 milhões de EUR adicionais.

Esta medida fará parte de um novo pacote, mais vasto, de apoio ao Afeganistão, que apresentaremos nas próximas semanas a fim de combinar os nossos esforços.

Senhoras e Senhores Deputados,

Assistir ao desenrolar dos acontecimentos no Afeganistão foi extremamente doloroso para todas as famílias dos militares mortos em combate.

Vergamo-nos perante o sacrifício desses soldados, dos diplomatas e dos trabalhadores humanitários que perderam as suas vidas.

Para garantir que o serviço prestado não foi em vão, temos de refletir sobre o que levou esta missão a terminar tão abruptamente.

Há questões profundamente preocupantes que os aliados terão de abordar no âmbito da NATO.

Porém, não há nenhuma questão de segurança e defesa para a qual a resposta seja menos cooperação. Temos de investir na nossa parceria conjunta e tirar proveito das forças de cada parte.

É por esta razão que estamos a trabalhar com o Secretário-Geral, Jens Stoltenberg, numa nova declaração conjunta UE-NATO, a apresentar antes do final do ano.

Mas esta é apenas uma parte da equação.

A Europa pode — e claramente deve — ser capaz e estar disposta a fazer mais por sua própria conta. Contudo, se quisermos fazer mais, temos de começar por explicar porquê. Entendo que existem três grandes categorias de razões.

Em primeiro lugar, temos de proporcionar estabilidade na nossa vizinhança e em diferentes regiões.

Estamos ligados ao mundo por ínfimos estreitos, mares tempestuosos e vastas fronteiras terrestres. Devido a essa geografia, a Europa sabe, melhor do que ninguém, que, se não lidar atempadamente com a crise além-fronteiras, a crise virá ao seu encontro.

Em segundo lugar, a natureza das ameaças que enfrentamos está a evoluir rapidamente: de ataques híbridos ou ciberataques à crescente corrida ao armamento no espaço.

As tecnologias disruptivas têm sido uma grande niveladora, permitindo que, hoje em dia, Estados párias ou grupos não estatais sejam capazes de manietar o poder.

Já não é necessário dispor de exércitos e mísseis para causar danos em massa. É possível paralisar instalações industriais, administrações locais e hospitais recorrendo apenas a um computador portátil. Um telemóvel inteligente e uma ligação à Internet são meios suficientes para comprometer processos eleitorais.

A terceira razão reside no facto de a União Europeia ser um garante da segurança ímpar. Haverá missões em que a NATO ou a ONU não estarão presentes, mas em que a UE deverá estar.

Os nossos soldados trabalham, no terreno, lado a lado com polícias, advogados e médicos, com trabalhadores humanitários e defensores dos direitos humanos, com professores e engenheiros.

Temos capacidade para combinar forças militares e civis, a par da diplomacia e do desenvolvimento, e temos uma longa história na construção e proteção da paz.

A boa notícia é que, ao longo dos últimos anos, começámos a desenvolver um ecossistema europeu de defesa.

Porém, carecemos de uma União Europeia da Defesa.

Ao longo das últimas semanas, têm decorrido muitos debates sobre forças expedicionárias. Sobre o tipo e a quantidade de que carecemos: agrupamentos táticos ou forças de intervenção da UE.

Tal faz, sem dúvida, parte do debate e creio que fará parte da solução.

Mas o mais fundamental é perceber por que razão tal não funcionou no passado.

É possível dispor das forças mais avançadas do mundo. Todavia, se nunca se estiver disposto a utilizá-las, qual é a sua utilidade?

O que nos tem impedido de avançar até agora não é a mera insuficiência de capacidades; é a falta de vontade política.

Se desenvolvermos essa vontade, há muito que podemos fazer a nível da UE.

Permitam-me apresentar três exemplos concretos:

Em primeiro lugar, temos de criar as bases para a tomada de decisões coletivas — aquilo a que chamo conhecimento da situação.

Ficamos aquém quando os Estados-Membros ativos na mesma região não partilham informações a nível europeu. É fundamental melhorar a cooperação em matéria de informações.

Não se trata apenas de informações em sentido estrito.

Trata-se de reunir os conhecimentos de todos os serviços e de todas as fontes. Do espaço à formação de agentes policiais, de fontes abertas às agências de desenvolvimento. O seu trabalho confere-nos um âmbito e uma profundidade de conhecimentos sem igual.

Todos estes trunfos estão disponíveis!

Mas só podemos aproveitá-los para tomar decisões informadas se tivermos uma visão global, o que não é o caso atualmente. O conhecimento de que dispomos é disperso. A informação está fragmentada.

É por esta razão que a UE poderia considerar criar o seu próprio Centro Comum de Conhecimento da Situação para agregar todas as informações disponíveis.

E, consequentemente, estar mais bem preparada, estar plenamente informada e ter condições para decidir.

Em segundo lugar, temos de melhorar a interoperabilidade. É por esta razão que já estamos a investir em plataformas europeias comuns, desde aviões de combate a aeronaves não tripuladas, passando pelo ciberespaço.

Mas temos de continuar a refletir sobre novas formas de tirar partido de todas as sinergias possíveis. Um exemplo poderia ser a possibilidade de renunciar à cobrança de IVA aquando da aquisição de equipamento de defesa desenvolvido e produzido na Europa.

Tal permitiria não só aumentar a interoperabilidade, como também reduzir as nossas dependências atuais.

Em terceiro lugar, não podemos falar de defesa sem referir o ciberespaço. Se tudo estiver ligado, tudo pode ser pirateado. Dada a escassez de recursos, temos de unir forças. E não nos devemos contentar com responder a ciberameaças, devemos igualmente aspirar à liderança no domínio da cibersegurança.

As ferramentas de ciberdefesa devem ser desenvolvidas aqui, na Europa. É por isso que precisamos de uma política europeia de ciberdefesa, incluindo legislação que estabeleça normas comuns no âmbito de um novo ato legislativo sobre a ciber-resiliência europeia.

É, assim, evidente que podemos fazer muito a nível da UE. Mas os Estados-Membros também têm de fazer mais.

Tal começa por uma avaliação comum das ameaças que enfrentamos e por uma abordagem comum para as enfrentar. As futuras orientações estratégicas sobre segurança e defesa são um processo importante deste debate.

E temos de decidir como podemos utilizar todas as possibilidades já previstas no Tratado.

Por isso, durante a Presidência francesa, convocarei, em conjunto com o presidente Emmanuel Macron, uma cimeira europeia de defesa.

É tempo de a Europa avançar para o nível seguinte.

Senhoras e Senhores Deputados,

Num mundo mais marcado por disputas, a proteção dos interesses individuais não se limita à defesa do próprio espaço.

Implica a criação de parcerias sólidas e fiáveis. Não se trata de um luxo, mas sim de um elemento essencial para a estabilidade, a segurança e a prosperidade futuras.

Este trabalho começa pelo aprofundar das parcerias com os nossos aliados mais próximos.

Desenvolveremos, com os EUA, uma nova agenda para a mudança global — desde o novo Conselho de Comércio e Tecnologia até à segurança sanitária e à sustentabilidade.

A UE e os EUA serão sempre mais fortes em conjunto.

O mesmo se aplica aos nossos vizinhos dos Balcãs Ocidentais.

Até ao final do mês, deslocar-me-ei à região para enviar um sinal forte do nosso empenho no processo de adesão. Devêmo-lo a todos os jovens que acreditam num futuro europeu.

É por esta razão que estamos a intensificar o nosso apoio por via do novo plano económico e de investimento, que representa cerca de um terço do PIB da região. Porque um investimento no futuro dos Balcãs Ocidentais é um investimento no futuro da UE.

Continuaremos igualmente a investir nas parcerias em toda a nossa vizinhança — desde o reforço do empenho na Parceria Oriental até à execução da nova Agenda para o Mediterrâneo e à prossecução dos trabalhos sobre os diferentes aspetos das nossas relações com a Turquia.

Senhoras e Senhores Deputados,

Para que a Europa se torne um interveniente mais ativo a nível mundial, terá também de se concentrar na próxima geração de parcerias.

Neste espírito, a nova estratégia da UE-Indo-Pacífico, hoje apresentada, constitui um marco importante.Reflete a importância crescente desta região para a nossa prosperidade e segurança, mas também o facto de certos regimes autocráticos a utilizarem para tentarem expandir a sua influência.

A Europa tem de estar mais presente e mais ativa na região.

Assim, trabalharemos em conjunto para aprofundar as relações comerciais, reforçar as cadeias de abastecimento globais e desenvolver novos projetos de investimento em tecnologias verdes e digitais.

Este é um exemplo de como a Europa pode reformular o seu modelo para ligar o mundo.

Somos bons no financiamento de estradas. Mas não faz sentido que a Europa construa uma estrada perfeita entre uma mina de cobre e um porto quando ambos são propriedade chinesa.

Temos de ser mais inteligentes no que toca a este tipo de investimentos.

Por isso, apresentaremos em breve uma nova estratégia em matéria de conectividade denominada Ponte Global.

Criaremos parcerias no âmbito da Ponte Global com países de todo o mundo. Queremos investir em infraestruturas de qualidade, ligando bens, pessoas e serviços em todo o mundo.

Adotaremos uma abordagem baseada em valores, oferecendo transparência e boa governação aos nossos parceiros.

Queremos criar ligações e não dependências!

E sabemos como fazer para que tal funcione. Desde o verão, um novo cabo de fibra ótica submarino liga o Brasil a Portugal.

Iremos investir com África para criar um mercado para o hidrogénio verde que ligue as duas margens do Mediterrâneo.

Para concretizar a Ponte Global, temos de aplicar uma abordagem da Equipa Europa. Ligaremos instituições e investimentos, bancos e a comunidade empresarial. Faremos desta questão uma prioridade nas cimeiras regionais — a começar pela próxima Cimeira UE-África, em fevereiro.

Queremos transformar a Ponte Global numa marca de confiança em todo o mundo.

Gostaria, porém, de ser muito clara: fazer negócios em todo o mundo, o comércio mundial… tudo isso é bom e necessário. Mas nunca pode ser feito em detrimento da dignidade e da liberdade das pessoas.

Há 25 milhões de pessoas, em todo o mundo, que realizam trabalho forçado devido a ameaças ou coação. Nunca poderemos aceitar que sejam obrigadas a fabricar produtos e que estes acabem depois à venda em lojas na Europa.

Por isso, proporemos a proibição da colocação no nosso mercado de produtos fabricados por trabalho forçado.

Os direitos humanos não estão à venda — a preço algum.

UMA EUROPA UNIDA NA LIBERDADE E DIVERSIDADE

Senhoras e Senhores Deputados, os seres humanos não são uma moeda de troca.

Vejamos o que aconteceu nas nossas fronteiras com a Bielorrússia. O regime de Minsk tem instrumentalizado seres humanos. Colocaram pessoas em aviões e empurraram-nas, literalmente, para as fronteiras da Europa.

Nunca poderemos tolerar esta situação.

A reação europeia que rapidamente se seguiu é prova disso. Podemos garantir que continuaremos a estar ao lado da Lituânia, da Letónia e da Polónia.

Chamemos as coisas pelos nomes: trata-se um ataque híbrido que pretende desestabilizar a Europa.

Senhoras e Senhores Deputados,

Estes não são acontecimentos isolados. Assistimos a incidentes semelhantes noutras fronteiras. E é fácil de prever que ocorram novamente. É por esta razão que, no âmbito do nosso trabalho sobre Schengen, iremos definir novas formas de reagir a tais agressões e assegurar a unidade na proteção das nossas fronteiras externas.

Porém, enquanto não encontrarmos um consenso sobre a forma de gerir a migração, os nossos opositores continuarão a explorar essa brecha.

Entretanto, os traficantes de seres humanos continuam a explorar pessoas em rotas mortíferas através do Mediterrâneo.

Estes eventos demonstram que todos os países têm interesse na construção de um sistema europeu de migração.

O Novo Pacto em matéria de Migração e Asilo dá-nos tudo o que precisamos para gerir os diferentes tipos de situações que enfrentamos.

Estão lá todos os elementos. Trata-se de um sistema equilibrado e humano que funciona para todos os Estados-Membros e em todas as circunstâncias. Sabemos que podemos criar consensos.

No entanto, no ano que se seguiu à apresentação do Pacto pela Comissão, os progressos foram penosamente lentos.

Este é, a meu ver, o momento certo para adotar uma política europeia de gestão da migração. Por conseguinte, insto-vos, nesta Câmara e nos Estados-Membros, a acelerar o processo.

Em última análise, tudo se resume a uma questão de confiança. Confiança entre os Estados-Membros. Confiança dos europeus na capacidade de gerir a migração. Confiança numa Europa que honre sempre o seu dever permanente para com os mais vulneráveis e mais necessitados.

Há muitos pontos de vista firmemente defendidos sobre a migração na Europa, mas creio que o consenso não se afigura distante.

Porque, se questionarmos os europeus, a maioria concordará que devemos agir para travar a migração irregular, mas também no sentido de proporcionar refúgio às pessoas forçadas a fugir.

Estarão de acordo com a repatriação daqueles que não têm o direito de permanecer no território da União, mas dirão que devemos dar as boas-vindas a quem viaja legalmente e dá um contributo tão importante para a nossa sociedade e economia.

Por fim, devemos todos concordar que o tema da migração nunca deve ser utilizado para dividir.

Estou convencida de que é possível criar confiança no seio da Europa no que diz respeito à migração.

Senhoras e Senhores Deputados,

As sociedades alicerçadas na democracia e nos valores comuns assentam numa base estável. Confiam nas pessoas.

É desta forma que se desenvolvem novas ideias, que surgem mudanças, é desta forma que se vence a injustiça.

A confiança nesses valores comuns foi o que uniu os nossos fundadores após a Segunda Guerra Mundial.

São esses mesmos valores que uniram os defensores da liberdade que derrubaram a Cortina de Ferro há mais de 30 anos.

Eles queriam democracia.

Queriam ser livres de eleger o próprio governo.

Queriam o Estado de direito,

a igualdade de todos perante a lei.

Queriam liberdade de expressão e meios de comunicação independentes.

Queriam acabar com a espionagem dos cidadãos pelo Estado e combater a corrupção.

Queriam ter a liberdade de serem diferentes da maioria.

Ou, como afirmou o antigo Presidente da República Checa, Vaclav Havel, queriam todos estes «extraordinários valores europeus».

Esses valores são o fruto da herança cultural, religiosa e humanista da Europa.

Fazem parte da nossa alma, são uma parte essencial daquilo que somos hoje.

Esses valores estão consagrados nos nossos tratados europeus.

E todos nós nos comprometemos a respeitar esses valores quando, na qualidade de Estados livres e soberanos, passámos a fazer parte desta União.

Estamos determinados a defender esses valores. Nunca abandonaremos essa determinação.

Os nossos valores são garantidos pela nossa ordem jurídica e protegidos pelas decisões do Tribunal de Justiça da União Europeia. Essas decisões são vinculativas. Velamos para que sejam efetivamente respeitadas. Em todos os Estados-Membros da nossa União.

A proteção do Estado de direito não é apenas um objetivo nobre, é também uma tarefa árdua e um esforço constante de melhoria.

Os nossos relatórios sobre o Estado de direito, graças às reformas que apresentam, fazem parte deste processo. Um exemplo disto são as reformas judiciais em Malta ou as investigações em matéria de corrupção na Eslováquia.

E, a partir de 2022, os nossos relatórios sobre o Estado de direito incluirão também recomendações concretas aos Estados-Membros.

No entanto, constatamos que há uma evolução preocupante em alguns Estados-Membros. Na minha opinião, uma coisa é fundamental - partir sempre de uma base de diálogo.

Mas o diálogo não é um fim em si mesmo; deve conduzir a um objetivo. É por esta razão que seguimos uma abordagem dupla, baseada no diálogo e na tomada de medidas decisivas.

Foi o que fizemos na semana passada. E continuaremos a fazê-lo.

E isto porque, em toda a Europa, as pessoas devem poder confiar num sistema judicial independente e ser tratadas de forma igual perante a lei, independentemente de fazerem parte de uma maioria ou de uma minoria.

Senhoras e Senhores Deputados,

O orçamento europeu é o futuro da nossa União traduzido em números. É por isso que deve ser protegido.

Temos de garantir que cada euro e cada cêntimo sejam utilizados para o objetivo certo

e de acordo com o Estado de direito. Os investimentos que permitam aos nossos filhos ter um futuro melhor não devem desaparecer de forma obscura.

A corrupção não significa apenas roubar dinheiro aos contribuintes. A corrupção desincentiva os investidores. A corrupção possibilita a compra de grandes favores com enormes somas de dinheiro e permite que os mais poderosos desrespeitem as regras democráticas.

Quando se trata de proteger o nosso orçamento, perseguiremos cada caso de corrupção com todos os meios ao nosso alcance.

Senhoras e Senhores Deputados,

Quando defendemos os nossos valores, defendemos também a liberdade. A liberdade de ser quem somos, a liberdade de dizer o que pensamos, a liberdade de amar quem queremos.

Mas liberdade também significa estar livre do medo. Durante a pandemia, muitas mulheres ficaram privadas dessa liberdade.

Foi um período particularmente difícil para todas as mulheres que não tinham onde se esconder, que não podiam escapar aos seus agressores. Temos de trazer luz a esta questão tão escura, temos de mostrar formas de escapar à dor, temos de levar esses agressores à justiça.

As mulheres devem poder voltar a viver livres e independentes.

Por conseguinte, antes do fim do ano iremos propor uma lei sobre o combate à violência contra as mulheres. Trata-se de garantir a aplicação eficaz da lei, a prevenção e a proteção, em linha e fora de linha.

Trata-se de fazer respeitar a dignidade de cada indivíduo, de garantir a justiça. Esta é a essência da Europa. Temos de a tornar mais forte.

Senhoras e Senhores Deputados,

Para terminar, permitam-me evocar uma liberdade que dá voz a todas as outras: a liberdade dos meios de comunicação social.

Há jornalistas, homens e mulheres, que são atacados pelo simples facto de fazerem o seu trabalho.

Alguns são ameaçados e espancados, outros são tragicamente assassinados. No seio da nossa União Europeia. Gostaria de citar alguns nomes. Daphné Caruana Galizia. Jan Kuciak. Peter de Vries.

As suas histórias podem ter pequenas diferenças. Mas há algo que têm em comum: todos eles lutaram pelo nosso direito à informação. E morreram por defenderem esse direito.

A informação é um bem público. Temos de defender os defensores da transparência, as mulheres e os homens jornalistas.

Por esse motivo, apresentamos hoje uma recomendação no sentido de melhorar a proteção dos jornalistas.

E devemos travar todos aqueles que ameaçam a liberdade dos meios de comunicação social. Os meios de comunicação social não são uma empresa qualquer.

A sua independência é fundamental. É por isso que a Europa precisa de uma lei que garanta essa independência.

No próximo ano, apresentaremos precisamente uma lei sobre a liberdade dos meios de comunicação social.

Quando defendemos a liberdade dos nossos meios de comunicação social, estamos também a defender a democracia.

CONCLUSÃO

Senhoras e Senhores Deputados,

Reforçar o ideal europeu de Robert Schuman que invoquei anteriormente é um trabalho contínuo.

Não devemos esconder as nossas incoerências e imperfeições.

Por muito imperfeita que possa ser, a nossa União é deliciosamente única e unicamente bela.

É uma União que reforça a liberdade individual graças à força da comunidade.

Uma União moldada tanto pela história e pelos valores que partilhamos como pelas diferentes culturas e perspetivas que a integram.

Uma União com alma.

Não é fácil encontrar as palavras certas para expressar a essência deste sentimento. É mais fácil pedi-las emprestadas a alguém que nos inspira. Por isso, trago hoje uma convidada de honra para este espaço.

É possível que muitos já conheçam esta italiana, vencedora de uma medalha de ouro, que conquistou o meu coração este verão.

Porém, talvez não saibam que, em abril, ela recebeu a notícia de que tinha a vida em perigo. Foi sujeita a cirurgia, lutou e recuperou.

Apenas 119 dias depois de deixar o hospital, ganhou uma medalha de ouro nos Jogos Paraolímpicos. Senhoras e Senhores Deputados, acompanhem-me nas boas-vindas a Beatrice Vio. Bebe, embora ainda tão jovem, já ultrapassou muitos obstáculos.

A sua história é feita de uma luta contra as probabilidades. De sucesso baseado no talento, na tenacidade e num espírito positivo indomável. Ela é a imagem da sua geração: uma líder e uma defensora das causas em que acredita.

Alguém que conseguiu alcançar tudo isso por acreditar que, se parece impossível, pode ser feito. Se sembra impossibile, allora si può fare.

Este era o espírito dos pais fundadores da Europa e é, agora, o espírito da próxima geração europeia. Deixemo-nos inspirar por Bebe e por todos os jovens que mudam a nossa perceção do que é possível.


Que nos mostram que podemos ser o que quisermos ser. Que podemos alcançar tudo aquilo em que acreditamos.

Senhoras e Senhores Deputados,

Esta é a alma da Europa.

Este é o futuro da Europa.

Façamos com que se torne mais forte, em conjunto.

Viva l'Europa.

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Notícia

Discurso de 2021 sobre o estado da União proferido pela presidente Ursula von der Leyen

"Faz fé o texto proferido"

A versão original do discurso está disponível aqui.

FORTALECER A ALMA DA NOSSA UNIÃO

Introdução

Senhor Presidente,
Senhoras e Senhores Deputados,

Muitas pessoas sentem que as suas vidas ficaram suspensas enquanto o mundo continuou a avançar rapidamente.

A rapidez dos acontecimentos e a magnitude dos desafios são por vezes difíceis de apreender.

Este tem sido, igualmente, um momento de balanço e introspeção. Das pessoas que reavaliam as suas vidas até aos debates mais amplos sobre a partilha de vacinas e valores partilhados.

Porém, quando recordo o ano que passou e olho para o presente estado da União, vejo uma alma forte em tudo o que fazemos.

Robert Schuman afirmou, em tempos: A Europa necessita de uma alma, de um ideal, e da vontade política para servir esse ideal.

A Europa deu vida a estas palavras nos últimos doze meses.

Escolhemos defrontar em conjunto a maior crise global de saúde do último século, para que todas as partes da Europa tenham o mesmo acesso a uma vacina que salva vidas.

Escolhemos responder em conjunto à mais profunda crise económica mundial de há décadas, com o Instrumento de Recuperação da União Europeia.

Escolhemos, enfim, enfrentar em conjunto a crise planetária mais grave de sempre, com o Pacto Ecológico Europeu.

Fizémo-lo em conjunto, como Comissão, como Parlamento, como 27 Estados-Membros. Como uma só Europa. E podemos orgulhar-nos disso.

Mas os tempos do coronavírus ainda não chegaram ao fim.

Enquanto a pandemia perdura, a nossa sociedade continua a sofrer — profundamente. Há corações que nunca poderemos remendar, histórias de vida que nunca poderemos concluir e tempo que nunca poderemos devolver aos nossos jovens. Enfrentamos desafios novos e duradouros num mundo que recupera — e se fratura — de forma desigual.

Não haja dúvidas: o próximo ano voltará a pôr-nos à prova.

No entanto, creio que o nosso espírito — a nossa alma — só revela verdadeiramente o seu esplendor quando é posto à prova.

Quando olho para a nossa União, sei que a Europa irá passar este teste.

O que me dá essa confiança é a inspiração que podemos retirar dos jovens europeus.

Porque os nossos jovens deram significado a palavras como empatia e solidariedade.
Eles acreditam que temos uma responsabilidade para com o planeta.
E, embora estejam preocupados com o futuro, estão determinados a melhorá-lo.

A nossa União será mais forte se for mais semelhante à próxima geração: ponderada, determinada e solidária. Assente em valores e ousada na ação.

Este espírito será mais importante do que nunca nos próximos doze meses. Esta é a mensagem da Carta de Intenções que enviei esta manhã ao Presidente David Sassoli e ao Primeiro-Ministro Janez Janša para definir as nossas prioridades para o próximo ano.

UMA EUROPA UNIDA NA ADVERSIDADE E NA RECUPERAÇÃO

Senhoras e Senhores Deputados,

Um ano é um período muito longo num contexto de pandemia.

Quando aqui estive, há 12 meses, não sabia quando — ou mesmo se — teríamos uma vacina segura e eficaz contra a COVID-19.

Porém, hoje, e contra todas as críticas, a Europa está na vanguarda a nível mundial.

Mais de 70 % dos adultos na UE estão totalmente vacinados. Fomos os únicos a partilhar metade da produção de vacinas com o resto do mundo. Disponibilizámos mais de 700 milhões de doses aos cidadãos europeus, bem como mais de 700 milhões de doses a mais de 130 países do resto do mundo.

Fomos a única região do mundo a fazê-lo.

Uma pandemia é uma maratona, não uma corrida de velocidade.

Seguimos a ciência.
Cumprimos face à Europa. Cumprimos face ao mundo.
Escolhemos a via certa, pois escolhemos a via europeia. E funcionou!

Todavia, embora tenhamos todas as razões para estarmos confiantes, não temos motivos para ficar complacentes.

A nossa primeira — e mais urgente — prioridade é acelerar a vacinação a nível mundial.

Com menos de 1 % das doses globais administradas em países de baixos rendimentos, a escala da injustiça e o nível de urgência são óbvios. Esta é uma das grandes questões geopolíticas do nosso tempo.

A Equipa Europa está a investir mil milhões de EUR para aumentar a capacidade de produção de mARN em África. Já nos comprometemos a partilhar 250 milhões de doses.

Posso hoje anunciar que a Comissão acrescentará uma nova doação de 200 milhões de doses adicionais em meados do próximo ano.

Trata-se de um investimento na solidariedade, mas também na saúde mundial.

A segunda prioridade é prosseguir os nossos esforços dentro da Europa.

Constatamos divergências preocupantes entre as taxas de vacinação na União.

Temos, por isso, de manter a dinâmica.

A Europa está preparada. Temos 1 800 milhões de doses adicionais garantidas. Tal é suficiente para nós e para a nossa vizinhança, quando for necessário administrar doses de reforço. Façamos tudo o que estiver ao nosso alcance para garantir que esta não se transforme numa pandemia dos não vacinados.

A última prioridade é reforçar a nossa preparação para as pandemias.

No ano passado, disse que era tempo de construir uma União Europeia da Saúde. Hoje, concretizamos esse desafio, apresentando uma proposta para criar e pôr em funcionamento a HERA.

Este será um trunfo enorme para enfrentar futuras ameaças para a saúde, numa fase mais precoce e em melhores condições.

Dispomos da capacidade científica e de inovação, dos conhecimentos especializados do setor privado e de autoridades nacionais competentes. Temos agora de reunir tudo isto, incluindo um financiamento maciço.

Assim, proponho uma nova missão de preparação e resiliência no domínio da saúde em toda a UE. Esta deve ser apoiada por um investimento da Equipa Europa de 50 mil milhões de EUR até 2027.

O nosso objetivo é garantir que nenhum vírus transformará uma epidemia local numa pandemia global. Não há melhor retorno do investimento do que este.

Senhoras e Senhores Deputados,

Os trabalhos sobre a União Europeia da Saúde constituem um grande passo em frente. Gostaria de agradecer a esta Câmara o seu apoio.

Demonstrámos que, quando atuamos em conjunto, conseguimos fazê-lo rapidamente.

Tomemos como exemplo o Certificado Digital da UE:

Até à data, foram emitidos mais de 400 milhões de certificados individuais em toda a Europa. No total, 42 países de 4 continentes apanharam o comboio.

A Comissão apresentou uma proposta em março.

O Parlamento Europeu deu-lhe o apoio necessário!
Três meses depois, estava operacional.

Graças a este esforço conjunto, enquanto o resto do mundo debatia essa possibilidade, a Europa concretizou-a.

Fizemos muitas coisas bem. Avançámos rapidamente para criar o SURE. Este programa apoiou mais de 31 milhões de trabalhadores e 2,5 milhões de empresas em toda a Europa.

Aprendemos com as lições do passado, quando estivemos demasiado divididos e demorámos a atuar.

A diferença é flagrante: da última vez, foram necessários oito anos para que o PIB da área do euro regressasse aos níveis anteriores à crise.

Desta feita, prevemos que 19 países regressem aos níveis anteriores à pandemia ainda este ano, ao passo que os restantes o conseguirão no seguinte. No último trimestre, o crescimento na área do euro ultrapassou tanto o dos EUA como o da China.

Mas isto é apenas o início. As lições da crise financeira devem servir de admonição: nessa altura, a Europa declarou vitória demasiado cedo e pagou o preço por isso. Não repetiremos esse erro.

A boa notícia é que, graças ao Instrumento de Recuperação da União Europeia, iremos agora investir tanto na recuperação a curto prazo como na prosperidade a longo prazo.

Abordaremos questões estruturais da nossa economia: das reformas do mercado de trabalho em Espanha, às reformas do regime de pensões na Eslovénia ou à reforma fiscal na Áustria.

Investiremos, num nível sem precedentes, na tecnologia 5G e na banda larga. Não menos importante será o investimento nas competências digitais. Para tal, precisamos da dedicação dos líderes europeus e de um diálogo estruturado ao mais alto nível.

A nossa resposta proporciona uma orientação clara tanto para os mercados como para os investidores.

Porém, quando olhamos para o futuro, temos igualmente de refletir sobre o modo como a crise alterou os contornos da economia — do aumento da dívida ao impacto desigual nos diversos setores, passando pelas novas formas de trabalho.

Para tal, a Comissão relançará o debate sobre a revisão da governação económica nas próximas semanas. O objetivo é chegar a um consenso sobre o caminho a seguir, bem a tempo de 2023.

Senhoras e Senhores Deputados,

Celebraremos em breve os 30 anos do mercado único da UE. Este tem sido, ao longo deste período, o grande impulsionador do progresso e da prosperidade na Europa.

No início da pandemia, defendêmo-lo contra as pressões da erosão e da fragmentação. No contexto da recuperação, o mercado único é o motor da criação de empregos de qualidade e da competitividade.

Este aspeto é particularmente importante no mercado único digital.

Apresentámos propostas ambiciosas ao longo do último ano.

Propostas para conter o poder de controlo de acesso exercido pelas grandes plataformas.

Para apoiar a responsabilidade democrática dessas plataformas.

Para promover a inovação.

Para canalizar o poder da inteligência artificial.

A questão digital é determinante e os Estados-Membros partilham desta visão. As despesas digitais no âmbito do Instrumento de Recuperação da União Europeia irão mesmo ultrapassar a meta de 20 %.

Tal reflete a importância de investir na soberania tecnológica europeia. Temos de redobrar esforços para moldar a transformação digital de acordo com as nossas próprias regras e valores.

Permitam-me dar destaque aos semicondutores, esses pequenos circuitos que fazem com que tudo funcione: dos telefones inteligentes e das trotinetas elétricas aos comboios ou a fábricas inteligentes inteiras.

Não existe mundo digital sem circuitos integrados. A verdade é que, enquanto falamos, algumas linhas de produção já estão a funcionar a um ritmo reduzido — apesar da procura crescente — devido à escassez de semicondutores.

Além disso, muito embora a procura mundial tenha explodido, a quota da Europa na globalidade da cadeia de valor, desde a conceção à capacidade de produção, diminuiu. Estamos dependentes dos circuitos mais avançados fabricados na Ásia.

Por conseguinte, não se trata apenas de uma questão de competitividade. Trata-se também de uma questão de soberania tecnológica. Coloquemos, por isso, toda a nossa atenção nesta questão.

Apresentaremos uma nova lei europeia no domínio dos circuitos integrados. Temos de interligar as nossas capacidades de investigação, conceção e ensaio de craveira mundial. Temos de coordenar investimentos nacionais e da UE ao longo da cadeia de valor.

O objetivo é criar em conjunto um ecossistema europeu de circuitos integrados de vanguarda, que inclua a produção. Tal será um garante da segurança do aprovisionamento e permitirá desenvolver novos mercados para tecnologias europeias revolucionárias.

Sem dúvida, trata-se de uma tarefa árdua. E estou ciente de que alguns alegam que é impossível.

Mas isso foi o mesmo que, há 20 anos, se disse sobre o Galileo.

E vejam o que aconteceu. Juntos, perseverámos. Hoje em dia, os satélites europeus fornecem o sistema de navegação a mais de 2 mil milhões de telemóveis inteligentes em todo o mundo. Somos líderes mundiais. Por isso, voltemos a ousar, desta vez com semicondutores.

Senhoras e Senhores Deputados,

A pandemia deixou marcas profundas e teve um impacto enorme na nossa economia social de mercado.

Noite após noite, marcámos presença, à janela ou à soleira da porta, para aplaudir os trabalhadores da primeira linha.

Todos nos apercebemos de quanto dependíamos destas pessoas. Profissionais empenhados com espírito de entrega, apesar de receberem um salário inferior, terem menos proteção e menos segurança.

Os aplausos nas ruas das nossas cidades podem ter cessado, mas a força das nossas emoções deve perdurar no tempo.

É por este motivo que é tão importante concretizar o Pilar Europeu dos Direitos Sociais.

Trata-se de criar empregos mais dignos, condições de trabalho mais justas, melhores cuidados de saúde e uma vida mais equilibrada.

Um dos principais ensinamentos que retirámos da pandemia foi o valor do tempo. Aprendemos que não existe tempo mais valioso do que aquele que consagramos aos nossos entes queridos.

Foi por esse motivo que decidimos propor uma nova estratégia europeia para a prestação de cuidados.

Para que todos os homens e todas as mulheres possam beneficiar dos melhores cuidados possíveis e alcancem um bom equilíbrio de vida. Mas a justiça social não é unicamente uma questão de tempo, é também uma questão de equidade fiscal.

Numa economia social de mercado como a nossa, é positivo que as empresas obtenham lucros. Mas, se os obtêm, é graças à qualidade das nossas infraestruturas, da nossa segurança social e dos nossos sistemas educativos.

Consequentemente, o mínimo que podem fazer é dar o seu justo contributo. É por esse motivo que vamos continuar a combater a evasão e a fraude fiscais.

Vamos apresentar uma proposta legislativa com o objetivo de tributar os lucros ocultos das empresas de fachada. E faremos todos os possíveis por celebrar um acordo histórico a nível mundial sobre a taxa mínima do imposto sobre o rendimento das pessoas coletivas.

O pagamento do montante justo em impostos não é apenas uma questão de finanças públicas, é sobretudo uma questão de equidade.

Senhoras e Senhores Deputados,

Todos beneficiámos com os fundamentos da economia social de mercado europeia. Temos de assegurar que a próxima geração pode construir o seu próprio futuro.

Dispomos de uma geração de jovens altamente qualificados, extremamente talentosos e fortemente motivados. Uma geração que sacrificou tanto em prol da segurança dos outros.

A juventude é, normalmente, a idade das descobertas. A idade em que se vivem novas experiências. Em que se fazem amigos que ficam para toda a vida. Em que cada um descobre o seu próprio caminho. Porém, o que acabámos de exigir aos nossos jovens? Que mantivessem o distanciamento social, que continuassem confinados e que seguissem os seus estudos em casa. Durante mais de um ano.

Tudo aquilo que temos feito, desde o Pacto Ecológico ao Instrumento de Recuperação da União Europeia, visa proteger o futuro dos nossos jovens.

É por isso que este instrumento deve ser financiado por novos recursos próprios, sobre os quais temos vindo a trabalhar.

De igual modo, temos de garantir que não damos origem a novas falhas. Porque a Europa precisa de todos os seus jovens.

Importa prestar apoio a todos aqueles que se encontram excluídos. Aqueles que não têm emprego. Aqueles que não estudam nem seguem qualquer formação.

Para os jovens nessa situação, tencionamos propor um novo programa, intitulado ALMA.

Esse programa dar-lhes-á a possibilidade de terem uma experiência profissional temporária noutro Estado-Membro.

Pois também estes jovens merecem ter uma experiência como o Erasmus, para poderem adquirir competências, estabelecer contactos e criar a sua própria identidade europeia.

Contudo, se queremos efetivamente moldar a nossa União à sua imagem, os jovens devem poder moldar, eles próprios, o futuro da Europa. A nossa União precisa de uma alma e de uma visão de futuro com que os jovens se identifiquem.

Como também se interrogou Jacques Delors: Como poderemos construir a Europa se os jovens não a virem como um projeto coletivo e uma representação do seu próprio futuro?

É por esta razão que tencionamos propor que 2022 seja o Ano Europeu da Juventude. Um ano consagrado à valorização dos jovens que, por seu turno, já abdicaram de tanto pelo bem dos outros. E serão também os jovens a liderar os debates da Conferência sobre o Futuro da Europa.

Trata-se do seu futuro e, por isso mesmo, deve tratar-se da sua conferência.

Como foi referido no início do nosso mandato, a Comissão estará pronta a dar seguimento a tudo o que for decidido pela Conferência.

UMA EUROPA UNIDA NA RESPONSABILIDADE

Senhoras e Senhores Deputados,

Esta é uma geração com consciência, que nos está a pressionar a ir mais longe e mais depressa para fazer face à crise climática.

Os acontecimentos deste verão só lhe vieram dar razão. Assistimos a inundações na Bélgica e na Alemanha. E a incêndios florestais consumindo ilhas gregas e colinas em França.

Se não acreditarmos nos nossos próprios olhos, basta-nos apenas seguir a ciência.

A ONU publicou recentemente o relatório do PIAC, o Painel Intergovernamental sobre as Alterações Climáticas. Trata-se da autoridade em matéria de ciência das alterações climáticas.

O relatório não deixa qualquer dúvida. As alterações climáticas têm origem humana. Mas, dada essa origem humana, podemos fazer algo em relação a ela.

Tal como ouvi recentemente: Está a aquecer. Fomos nós. Temos a certeza. A situação é má. Mas tem solução.

E essa mudança já está a acontecer.

No primeiro semestre deste ano, foram registados na Alemanha mais veículos elétricos do que veículos a gasóleo. A Polónia é atualmente o maior exportador da UE de baterias de automóveis e autocarros elétricos. Ou tomemos o exemplo do novo Bauhaus europeu, que levou a uma explosão da criatividade de arquitetos, designers e engenheiros em toda a União.

É evidente que algo se está a passar.

E esse é o cerne do Pacto Ecológico Europeu.

No meu discurso do ano passado, anunciei a meta de, pelo menos, 55 % de redução das emissões até 2030.
Desde então, transformámos os nossos objetivos climáticos em obrigações jurídicas.
Fomos a primeira grande economia a apresentar legislação abrangente para conseguir concretizar esses objetivos.

Já perceberam a complexidade dos pormenores. Mas o objetivo é simples. Fixaremos um preço para a poluição. Limparemos a energia que utilizamos. Teremos automóveis mais inteligentes e aviões mais limpos.

E asseguraremos que o reforço da ambição climática seja acompanhado de uma maior ambição social. Esta transição ecológica tem de ser justa. É por esta razão que propusemos um novo Fundo Social para a Ação Climática, que visa combater a pobreza energética que já afeta 34 milhões de europeus.

Conto com o Parlamento e com os Estados-Membros para honrarem este pacote e esta ambição, em conjunto.

A Europa pode fazer muito no que diz respeito às alterações climáticas e à crise do mundo natural. E apoiará outros países neste processo. Tenho o prazer de anunciar, hoje, que a UE duplicará o financiamento externo para a biodiversidade, em especial para os países mais vulneráveis.

Mas a Europa não pode fazê-lo sozinha.

A COP26, que terá lugar em Glasgow, será um momento decisivo para a comunidade global.

As principais economias — dos EUA ao Japão — estabeleceram a ambição de alcançar a neutralidade climática em 2050 ou pouco tempo depois. Estes objetivos têm, agora, de ser apoiados por planos concretos, elaborados a tempo da conferência de Glasgow. Isto porque os atuais compromissos para 2030 não permitirão concretizar o objetivo de manter o aquecimento global abaixo dos 1,5 °C.

Todos os países têm uma quota-parte de responsabilidade!

Os objetivos que o Presidente Xi Jinping fixou para a China são encorajadores. Mas apelamos para essa mesma liderança no que toca a definir o modo como a China lá chegará. O mundo ficaria aliviado se os líderes chineses demonstrassem capacidade para atingir o pico de emissões até meados da década e se afastarem do carvão, tanto a nível interno como no estrangeiro.

Embora todos os países partilhem esta responsabilidade, as principais economias têm obrigações especiais perante os países menos desenvolvidos e mais vulneráveis. O financiamento da ação climática é essencial para estes países — tanto para efeitos de atenuação como de adaptação.

No México e em Paris, o mundo comprometeu-se a disponibilizar 100 mil milhões de dólares por ano até 2025.

Cumprimos o nosso compromisso. A Equipa Europa contribui com 25 mil milhões de dólares por ano. Mas outras partes continuam a apresentar lacunas profundas no sentido de atingir o objetivo global.

Colmatar estas lacunas aumentará as possibilidades de sucesso em Glasgow.

Hoje, a minha mensagem é a de que a Europa está pronta para fazer mais. Proporemos um montante adicional de 4 mil milhões de EUR para o financiamento da ação climática até 2027. Mas esperamos que os Estados Unidos e os nossos parceiros também intensifiquem os seus esforços.

Se os EUA e a UE colmatassem, em conjunto, o défice de financiamento da ação climática, transmitiriam um forte sinal de liderança global em matéria de clima. É hora de agir.

Senhoras e Senhores Deputados,

Esta liderança climática e económica é fundamental para os objetivos globais e de segurança da Europa.

Reflete igualmente uma mudança mais generalizada nos assuntos mundiais num momento de transição para uma nova ordem internacional.

Estamos a entrar numa nova era de hipercompetitividade.

Uma era em que alguns recorrem a todos os estratagemas para ganhar influência: sejam eles promessas de vacinas e empréstimos com taxas de juro elevadas ou mísseis e desinformação.

Uma era de rivalidades regionais e de grandes potências que se vigiam entre si.

Os acontecimentos recentes no Afeganistão não são a causa desta mudança, são antes um sintoma.

Antes de mais, quero ser clara: estamos ao lado do povo afegão. Das mulheres e das crianças, dos procuradores, dos jornalistas e dos defensores dos direitos humanos.

Penso, em especial, nas mulheres juízes que se escondem agora dos homens que condenaram à prisão. Estas mulheres estão em risco devido ao seu contributo para a justiça e o Estado de direito. Temos de as apoiar e coordenaremos todos os esforços com os Estados-Membros para as colocar em segurança.

De igual modo, temos de continuar a apoiar todos os afegãos no país e nos países vizinhos. É nossa obrigação fazer tudo o que estiver ao nosso alcance para evitar o risco real de uma grande fome e de uma catástrofe humanitária. Faremos a nossa parte, aumentando a ajuda humanitária concedida ao Afeganistão, com 100 milhões de EUR adicionais.

Esta medida fará parte de um novo pacote, mais vasto, de apoio ao Afeganistão, que apresentaremos nas próximas semanas a fim de combinar os nossos esforços.

Senhoras e Senhores Deputados,

Assistir ao desenrolar dos acontecimentos no Afeganistão foi extremamente doloroso para todas as famílias dos militares mortos em combate.

Vergamo-nos perante o sacrifício desses soldados, dos diplomatas e dos trabalhadores humanitários que perderam as suas vidas.

Para garantir que o serviço prestado não foi em vão, temos de refletir sobre o que levou esta missão a terminar tão abruptamente.

Há questões profundamente preocupantes que os aliados terão de abordar no âmbito da NATO.

Porém, não há nenhuma questão de segurança e defesa para a qual a resposta seja menos cooperação. Temos de investir na nossa parceria conjunta e tirar proveito das forças de cada parte.

É por esta razão que estamos a trabalhar com o Secretário-Geral, Jens Stoltenberg, numa nova declaração conjunta UE-NATO, a apresentar antes do final do ano.

Mas esta é apenas uma parte da equação.

A Europa pode — e claramente deve — ser capaz e estar disposta a fazer mais por sua própria conta. Contudo, se quisermos fazer mais, temos de começar por explicar porquê. Entendo que existem três grandes categorias de razões.

Em primeiro lugar, temos de proporcionar estabilidade na nossa vizinhança e em diferentes regiões.

Estamos ligados ao mundo por ínfimos estreitos, mares tempestuosos e vastas fronteiras terrestres. Devido a essa geografia, a Europa sabe, melhor do que ninguém, que, se não lidar atempadamente com a crise além-fronteiras, a crise virá ao seu encontro.

Em segundo lugar, a natureza das ameaças que enfrentamos está a evoluir rapidamente: de ataques híbridos ou ciberataques à crescente corrida ao armamento no espaço.

As tecnologias disruptivas têm sido uma grande niveladora, permitindo que, hoje em dia, Estados párias ou grupos não estatais sejam capazes de manietar o poder.

Já não é necessário dispor de exércitos e mísseis para causar danos em massa. É possível paralisar instalações industriais, administrações locais e hospitais recorrendo apenas a um computador portátil. Um telemóvel inteligente e uma ligação à Internet são meios suficientes para comprometer processos eleitorais.

A terceira razão reside no facto de a União Europeia ser um garante da segurança ímpar. Haverá missões em que a NATO ou a ONU não estarão presentes, mas em que a UE deverá estar.

Os nossos soldados trabalham, no terreno, lado a lado com polícias, advogados e médicos, com trabalhadores humanitários e defensores dos direitos humanos, com professores e engenheiros.

Temos capacidade para combinar forças militares e civis, a par da diplomacia e do desenvolvimento, e temos uma longa história na construção e proteção da paz.

A boa notícia é que, ao longo dos últimos anos, começámos a desenvolver um ecossistema europeu de defesa.

Porém, carecemos de uma União Europeia da Defesa.

Ao longo das últimas semanas, têm decorrido muitos debates sobre forças expedicionárias. Sobre o tipo e a quantidade de que carecemos: agrupamentos táticos ou forças de intervenção da UE.

Tal faz, sem dúvida, parte do debate e creio que fará parte da solução.

Mas o mais fundamental é perceber por que razão tal não funcionou no passado.

É possível dispor das forças mais avançadas do mundo. Todavia, se nunca se estiver disposto a utilizá-las, qual é a sua utilidade?

O que nos tem impedido de avançar até agora não é a mera insuficiência de capacidades; é a falta de vontade política.

Se desenvolvermos essa vontade, há muito que podemos fazer a nível da UE.

Permitam-me apresentar três exemplos concretos:

Em primeiro lugar, temos de criar as bases para a tomada de decisões coletivas — aquilo a que chamo conhecimento da situação.

Ficamos aquém quando os Estados-Membros ativos na mesma região não partilham informações a nível europeu. É fundamental melhorar a cooperação em matéria de informações.

Não se trata apenas de informações em sentido estrito.

Trata-se de reunir os conhecimentos de todos os serviços e de todas as fontes. Do espaço à formação de agentes policiais, de fontes abertas às agências de desenvolvimento. O seu trabalho confere-nos um âmbito e uma profundidade de conhecimentos sem igual.

Todos estes trunfos estão disponíveis!

Mas só podemos aproveitá-los para tomar decisões informadas se tivermos uma visão global, o que não é o caso atualmente. O conhecimento de que dispomos é disperso. A informação está fragmentada.

É por esta razão que a UE poderia considerar criar o seu próprio Centro Comum de Conhecimento da Situação para agregar todas as informações disponíveis.

E, consequentemente, estar mais bem preparada, estar plenamente informada e ter condições para decidir.

Em segundo lugar, temos de melhorar a interoperabilidade. É por esta razão que já estamos a investir em plataformas europeias comuns, desde aviões de combate a aeronaves não tripuladas, passando pelo ciberespaço.

Mas temos de continuar a refletir sobre novas formas de tirar partido de todas as sinergias possíveis. Um exemplo poderia ser a possibilidade de renunciar à cobrança de IVA aquando da aquisição de equipamento de defesa desenvolvido e produzido na Europa.

Tal permitiria não só aumentar a interoperabilidade, como também reduzir as nossas dependências atuais.

Em terceiro lugar, não podemos falar de defesa sem referir o ciberespaço. Se tudo estiver ligado, tudo pode ser pirateado. Dada a escassez de recursos, temos de unir forças. E não nos devemos contentar com responder a ciberameaças, devemos igualmente aspirar à liderança no domínio da cibersegurança.

As ferramentas de ciberdefesa devem ser desenvolvidas aqui, na Europa. É por isso que precisamos de uma política europeia de ciberdefesa, incluindo legislação que estabeleça normas comuns no âmbito de um novo ato legislativo sobre a ciber-resiliência europeia.

É, assim, evidente que podemos fazer muito a nível da UE. Mas os Estados-Membros também têm de fazer mais.

Tal começa por uma avaliação comum das ameaças que enfrentamos e por uma abordagem comum para as enfrentar. As futuras orientações estratégicas sobre segurança e defesa são um processo importante deste debate.

E temos de decidir como podemos utilizar todas as possibilidades já previstas no Tratado.

Por isso, durante a Presidência francesa, convocarei, em conjunto com o presidente Emmanuel Macron, uma cimeira europeia de defesa.

É tempo de a Europa avançar para o nível seguinte.

Senhoras e Senhores Deputados,

Num mundo mais marcado por disputas, a proteção dos interesses individuais não se limita à defesa do próprio espaço.

Implica a criação de parcerias sólidas e fiáveis. Não se trata de um luxo, mas sim de um elemento essencial para a estabilidade, a segurança e a prosperidade futuras.

Este trabalho começa pelo aprofundar das parcerias com os nossos aliados mais próximos.

Desenvolveremos, com os EUA, uma nova agenda para a mudança global — desde o novo Conselho de Comércio e Tecnologia até à segurança sanitária e à sustentabilidade.

A UE e os EUA serão sempre mais fortes em conjunto.

O mesmo se aplica aos nossos vizinhos dos Balcãs Ocidentais.

Até ao final do mês, deslocar-me-ei à região para enviar um sinal forte do nosso empenho no processo de adesão. Devêmo-lo a todos os jovens que acreditam num futuro europeu.

É por esta razão que estamos a intensificar o nosso apoio por via do novo plano económico e de investimento, que representa cerca de um terço do PIB da região. Porque um investimento no futuro dos Balcãs Ocidentais é um investimento no futuro da UE.

Continuaremos igualmente a investir nas parcerias em toda a nossa vizinhança — desde o reforço do empenho na Parceria Oriental até à execução da nova Agenda para o Mediterrâneo e à prossecução dos trabalhos sobre os diferentes aspetos das nossas relações com a Turquia.

Senhoras e Senhores Deputados,

Para que a Europa se torne um interveniente mais ativo a nível mundial, terá também de se concentrar na próxima geração de parcerias.

Neste espírito, a nova estratégia da UE-Indo-Pacífico, hoje apresentada, constitui um marco importante.Reflete a importância crescente desta região para a nossa prosperidade e segurança, mas também o facto de certos regimes autocráticos a utilizarem para tentarem expandir a sua influência.

A Europa tem de estar mais presente e mais ativa na região.

Assim, trabalharemos em conjunto para aprofundar as relações comerciais, reforçar as cadeias de abastecimento globais e desenvolver novos projetos de investimento em tecnologias verdes e digitais.

Este é um exemplo de como a Europa pode reformular o seu modelo para ligar o mundo.

Somos bons no financiamento de estradas. Mas não faz sentido que a Europa construa uma estrada perfeita entre uma mina de cobre e um porto quando ambos são propriedade chinesa.

Temos de ser mais inteligentes no que toca a este tipo de investimentos.

Por isso, apresentaremos em breve uma nova estratégia em matéria de conectividade denominada Ponte Global.

Criaremos parcerias no âmbito da Ponte Global com países de todo o mundo. Queremos investir em infraestruturas de qualidade, ligando bens, pessoas e serviços em todo o mundo.

Adotaremos uma abordagem baseada em valores, oferecendo transparência e boa governação aos nossos parceiros.

Queremos criar ligações e não dependências!

E sabemos como fazer para que tal funcione. Desde o verão, um novo cabo de fibra ótica submarino liga o Brasil a Portugal.

Iremos investir com África para criar um mercado para o hidrogénio verde que ligue as duas margens do Mediterrâneo.

Para concretizar a Ponte Global, temos de aplicar uma abordagem da Equipa Europa. Ligaremos instituições e investimentos, bancos e a comunidade empresarial. Faremos desta questão uma prioridade nas cimeiras regionais — a começar pela próxima Cimeira UE-África, em fevereiro.

Queremos transformar a Ponte Global numa marca de confiança em todo o mundo.

Gostaria, porém, de ser muito clara: fazer negócios em todo o mundo, o comércio mundial… tudo isso é bom e necessário. Mas nunca pode ser feito em detrimento da dignidade e da liberdade das pessoas.

Há 25 milhões de pessoas, em todo o mundo, que realizam trabalho forçado devido a ameaças ou coação. Nunca poderemos aceitar que sejam obrigadas a fabricar produtos e que estes acabem depois à venda em lojas na Europa.

Por isso, proporemos a proibição da colocação no nosso mercado de produtos fabricados por trabalho forçado.

Os direitos humanos não estão à venda — a preço algum.

UMA EUROPA UNIDA NA LIBERDADE E DIVERSIDADE

Senhoras e Senhores Deputados, os seres humanos não são uma moeda de troca.

Vejamos o que aconteceu nas nossas fronteiras com a Bielorrússia. O regime de Minsk tem instrumentalizado seres humanos. Colocaram pessoas em aviões e empurraram-nas, literalmente, para as fronteiras da Europa.

Nunca poderemos tolerar esta situação.

A reação europeia que rapidamente se seguiu é prova disso. Podemos garantir que continuaremos a estar ao lado da Lituânia, da Letónia e da Polónia.

Chamemos as coisas pelos nomes: trata-se um ataque híbrido que pretende desestabilizar a Europa.

Senhoras e Senhores Deputados,

Estes não são acontecimentos isolados. Assistimos a incidentes semelhantes noutras fronteiras. E é fácil de prever que ocorram novamente. É por esta razão que, no âmbito do nosso trabalho sobre Schengen, iremos definir novas formas de reagir a tais agressões e assegurar a unidade na proteção das nossas fronteiras externas.

Porém, enquanto não encontrarmos um consenso sobre a forma de gerir a migração, os nossos opositores continuarão a explorar essa brecha.

Entretanto, os traficantes de seres humanos continuam a explorar pessoas em rotas mortíferas através do Mediterrâneo.

Estes eventos demonstram que todos os países têm interesse na construção de um sistema europeu de migração.

O Novo Pacto em matéria de Migração e Asilo dá-nos tudo o que precisamos para gerir os diferentes tipos de situações que enfrentamos.

Estão lá todos os elementos. Trata-se de um sistema equilibrado e humano que funciona para todos os Estados-Membros e em todas as circunstâncias. Sabemos que podemos criar consensos.

No entanto, no ano que se seguiu à apresentação do Pacto pela Comissão, os progressos foram penosamente lentos.

Este é, a meu ver, o momento certo para adotar uma política europeia de gestão da migração. Por conseguinte, insto-vos, nesta Câmara e nos Estados-Membros, a acelerar o processo.

Em última análise, tudo se resume a uma questão de confiança. Confiança entre os Estados-Membros. Confiança dos europeus na capacidade de gerir a migração. Confiança numa Europa que honre sempre o seu dever permanente para com os mais vulneráveis e mais necessitados.

Há muitos pontos de vista firmemente defendidos sobre a migração na Europa, mas creio que o consenso não se afigura distante.

Porque, se questionarmos os europeus, a maioria concordará que devemos agir para travar a migração irregular, mas também no sentido de proporcionar refúgio às pessoas forçadas a fugir.

Estarão de acordo com a repatriação daqueles que não têm o direito de permanecer no território da União, mas dirão que devemos dar as boas-vindas a quem viaja legalmente e dá um contributo tão importante para a nossa sociedade e economia.

Por fim, devemos todos concordar que o tema da migração nunca deve ser utilizado para dividir.

Estou convencida de que é possível criar confiança no seio da Europa no que diz respeito à migração.

Senhoras e Senhores Deputados,

As sociedades alicerçadas na democracia e nos valores comuns assentam numa base estável. Confiam nas pessoas.

É desta forma que se desenvolvem novas ideias, que surgem mudanças, é desta forma que se vence a injustiça.

A confiança nesses valores comuns foi o que uniu os nossos fundadores após a Segunda Guerra Mundial.

São esses mesmos valores que uniram os defensores da liberdade que derrubaram a Cortina de Ferro há mais de 30 anos.

Eles queriam democracia.

Queriam ser livres de eleger o próprio governo.

Queriam o Estado de direito,

a igualdade de todos perante a lei.

Queriam liberdade de expressão e meios de comunicação independentes.

Queriam acabar com a espionagem dos cidadãos pelo Estado e combater a corrupção.

Queriam ter a liberdade de serem diferentes da maioria.

Ou, como afirmou o antigo Presidente da República Checa, Vaclav Havel, queriam todos estes «extraordinários valores europeus».

Esses valores são o fruto da herança cultural, religiosa e humanista da Europa.

Fazem parte da nossa alma, são uma parte essencial daquilo que somos hoje.

Esses valores estão consagrados nos nossos tratados europeus.

E todos nós nos comprometemos a respeitar esses valores quando, na qualidade de Estados livres e soberanos, passámos a fazer parte desta União.

Estamos determinados a defender esses valores. Nunca abandonaremos essa determinação.

Os nossos valores são garantidos pela nossa ordem jurídica e protegidos pelas decisões do Tribunal de Justiça da União Europeia. Essas decisões são vinculativas. Velamos para que sejam efetivamente respeitadas. Em todos os Estados-Membros da nossa União.

A proteção do Estado de direito não é apenas um objetivo nobre, é também uma tarefa árdua e um esforço constante de melhoria.

Os nossos relatórios sobre o Estado de direito, graças às reformas que apresentam, fazem parte deste processo. Um exemplo disto são as reformas judiciais em Malta ou as investigações em matéria de corrupção na Eslováquia.

E, a partir de 2022, os nossos relatórios sobre o Estado de direito incluirão também recomendações concretas aos Estados-Membros.

No entanto, constatamos que há uma evolução preocupante em alguns Estados-Membros. Na minha opinião, uma coisa é fundamental - partir sempre de uma base de diálogo.

Mas o diálogo não é um fim em si mesmo; deve conduzir a um objetivo. É por esta razão que seguimos uma abordagem dupla, baseada no diálogo e na tomada de medidas decisivas.

Foi o que fizemos na semana passada. E continuaremos a fazê-lo.

E isto porque, em toda a Europa, as pessoas devem poder confiar num sistema judicial independente e ser tratadas de forma igual perante a lei, independentemente de fazerem parte de uma maioria ou de uma minoria.

Senhoras e Senhores Deputados,

O orçamento europeu é o futuro da nossa União traduzido em números. É por isso que deve ser protegido.

Temos de garantir que cada euro e cada cêntimo sejam utilizados para o objetivo certo

e de acordo com o Estado de direito. Os investimentos que permitam aos nossos filhos ter um futuro melhor não devem desaparecer de forma obscura.

A corrupção não significa apenas roubar dinheiro aos contribuintes. A corrupção desincentiva os investidores. A corrupção possibilita a compra de grandes favores com enormes somas de dinheiro e permite que os mais poderosos desrespeitem as regras democráticas.

Quando se trata de proteger o nosso orçamento, perseguiremos cada caso de corrupção com todos os meios ao nosso alcance.

Senhoras e Senhores Deputados,

Quando defendemos os nossos valores, defendemos também a liberdade. A liberdade de ser quem somos, a liberdade de dizer o que pensamos, a liberdade de amar quem queremos.

Mas liberdade também significa estar livre do medo. Durante a pandemia, muitas mulheres ficaram privadas dessa liberdade.

Foi um período particularmente difícil para todas as mulheres que não tinham onde se esconder, que não podiam escapar aos seus agressores. Temos de trazer luz a esta questão tão escura, temos de mostrar formas de escapar à dor, temos de levar esses agressores à justiça.

As mulheres devem poder voltar a viver livres e independentes.

Por conseguinte, antes do fim do ano iremos propor uma lei sobre o combate à violência contra as mulheres. Trata-se de garantir a aplicação eficaz da lei, a prevenção e a proteção, em linha e fora de linha.

Trata-se de fazer respeitar a dignidade de cada indivíduo, de garantir a justiça. Esta é a essência da Europa. Temos de a tornar mais forte.

Senhoras e Senhores Deputados,

Para terminar, permitam-me evocar uma liberdade que dá voz a todas as outras: a liberdade dos meios de comunicação social.

Há jornalistas, homens e mulheres, que são atacados pelo simples facto de fazerem o seu trabalho.

Alguns são ameaçados e espancados, outros são tragicamente assassinados. No seio da nossa União Europeia. Gostaria de citar alguns nomes. Daphné Caruana Galizia. Jan Kuciak. Peter de Vries.

As suas histórias podem ter pequenas diferenças. Mas há algo que têm em comum: todos eles lutaram pelo nosso direito à informação. E morreram por defenderem esse direito.

A informação é um bem público. Temos de defender os defensores da transparência, as mulheres e os homens jornalistas.

Por esse motivo, apresentamos hoje uma recomendação no sentido de melhorar a proteção dos jornalistas.

E devemos travar todos aqueles que ameaçam a liberdade dos meios de comunicação social. Os meios de comunicação social não são uma empresa qualquer.

A sua independência é fundamental. É por isso que a Europa precisa de uma lei que garanta essa independência.

No próximo ano, apresentaremos precisamente uma lei sobre a liberdade dos meios de comunicação social.

Quando defendemos a liberdade dos nossos meios de comunicação social, estamos também a defender a democracia.

CONCLUSÃO

Senhoras e Senhores Deputados,

Reforçar o ideal europeu de Robert Schuman que invoquei anteriormente é um trabalho contínuo.

Não devemos esconder as nossas incoerências e imperfeições.

Por muito imperfeita que possa ser, a nossa União é deliciosamente única e unicamente bela.

É uma União que reforça a liberdade individual graças à força da comunidade.

Uma União moldada tanto pela história e pelos valores que partilhamos como pelas diferentes culturas e perspetivas que a integram.

Uma União com alma.

Não é fácil encontrar as palavras certas para expressar a essência deste sentimento. É mais fácil pedi-las emprestadas a alguém que nos inspira. Por isso, trago hoje uma convidada de honra para este espaço.

É possível que muitos já conheçam esta italiana, vencedora de uma medalha de ouro, que conquistou o meu coração este verão.

Porém, talvez não saibam que, em abril, ela recebeu a notícia de que tinha a vida em perigo. Foi sujeita a cirurgia, lutou e recuperou.

Apenas 119 dias depois de deixar o hospital, ganhou uma medalha de ouro nos Jogos Paraolímpicos. Senhoras e Senhores Deputados, acompanhem-me nas boas-vindas a Beatrice Vio. Bebe, embora ainda tão jovem, já ultrapassou muitos obstáculos.

A sua história é feita de uma luta contra as probabilidades. De sucesso baseado no talento, na tenacidade e num espírito positivo indomável. Ela é a imagem da sua geração: uma líder e uma defensora das causas em que acredita.

Alguém que conseguiu alcançar tudo isso por acreditar que, se parece impossível, pode ser feito. Se sembra impossibile, allora si può fare.

Este era o espírito dos pais fundadores da Europa e é, agora, o espírito da próxima geração europeia. Deixemo-nos inspirar por Bebe e por todos os jovens que mudam a nossa perceção do que é possível.


Que nos mostram que podemos ser o que quisermos ser. Que podemos alcançar tudo aquilo em que acreditamos.

Senhoras e Senhores Deputados,

Esta é a alma da Europa.

Este é o futuro da Europa.

Façamos com que se torne mais forte, em conjunto.

Viva l'Europa.

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